Por: Ricardo Silva
Longevidade no esporte traz experiência e qualidade, desde que a juventude permaneça na alma. Duas atletas do futsal e futebol feminino da Kurdana/Cotia são exemplo disso: a ala/meia Priscila e a pivô/lateral Xininha. Estas, junto com Susana, Aliny Neguinha e Arine, fecham o bloco das cinco renovações com mais tempo de casa no clube cotiano.
Ao todo, 16 atletas tiveram suas permanências confirmadas de 2011 para 2012 no plantel adulto, junto com duas subidas da base, uma vinda de peneira e uma contratação. Pode ser que esse grupo de 20 aumente após o Carnaval. Por hora, elas estão finalizando, junto com o Sub 17, os trabalhos de pré-temporada em Bertioga (litoral norte de São Paulo) neste dia 16, com um coletivo matinal.
Saibam mais dessas duas batalhadoras com a bola nos pés
* Priscila: magia e sabedoria numa só pessoa
Aquela 10 de Cotia sempre chamou a atenção. Pequena, habilidosa e capaz de coisas incríveis. Põe a bola onde quer com seus pés e faz um goleiro-linha que já virou escola. Tudo isso é pouco para falar dessa excelente atleta.
Priscila Rosalina Pereira é paulistana de 20/01/1984. Começou a jogar com grandes camisas já aos 12 anos, no São Paulo FC, em 1996, na quadra. Após dois anos de futsal, foi para o campo, passando as temporadas de 1998 e 99 naquele que era o maior clube feminino nos gramados, àquela época. Teve o gosto de ser bicampeã paulista e brasileira. E, mesmo com pouca idade, ainda em 1999 foi para o Fluminense, o tricolor das Laranjeiras. Uma menina de 15 anos, na Cidade Maravilhosa...
Em 2000, retornou para São Paulo, jogando campo por Taboão da Serra. E, em 2001, ela pisou em Cotia, na equipe de futebol e futsal que estava em formação. Agora, dividia-se entre as duas modalidades.
E, logo no seu primeiro ano, algo que chamou a atenção de todo mundo. Era para ser apenas mais um jogo da Associação Sabesp na categoria Principal, indubitavelmente o maior campeão da história do futsal feminino. Na época, a técnica Andressa de Azevedo atuava no banco de reservas em parceria com Sandra, ficando os gramados para a primeira e as quadras para a segunda. Com dez minutos, o placar já apontava Sabesp 4 a 0.
Ousada como sempre, Sessa insistia para que Sandra colocasse aquela pequena jovem de goleira. Com o jogo 'perdido', Priscila foi para debaixo das traves. E o placar começou a mudar. Cotia reagiu, reduzindo a diferença para 4 a 3. Não veio a vitória, mas ela não sofreu um gol sequer.
A partir dali, a 10 cotiana começou a ser observada por todos. As conquistas não paravam de vir: bronze nos Regionais de 2001 (campo), vice Estadual Sub 20 de 2003, sexta na Taça Brasil Sub 20 de 2004, vice da Copa Topper no mesmo ano e prata nos Abertos do Interior de 2005 (todos no futsal).
Vieram também os triunfos pessoais. Priscila conseguiu ser vencedora quatro vezes seguidas do Tênis de Ouro da Federação Paulista, de 2002 a 05, sendo as três primeiras no Sub 20, além de artilheira da Topper de 04. O feito dos Tênis de Ouro coloca-a entre as maiores jogadoras de futsal da história de São Paulo. Como mérito, veio a convocação para a Seleção Paulista de 2004, bicampeã nacional em Belém (PA). Junto com ela, estava uma futura companheira com a camisa da Kurdana, a goleira Márcia.
Em 2005, a marcante participação no Universitário Paulista de futsal. Naqueles anos, a Kurdana representava a FAAC, e conseguiu a proeza de vencer todas as séries da competição - Cobre, Bronze, Prata e Ouro. Mesmo assim, teve que jogar um longuíssimo e estranho play-off de cinco partidas contra a Unip, representada pela Sabesp, para apurar quem iria à Olimpíada Universitária-JUBs. A FAAC só perdeu no quinto jogo, por apertados 2 a 1, e ficou de fora. Como consolo, Priscila e as jovens disputaram o Sul-Sudeste Brasileiro em Belo Horizonte (MG). Não deu outra: primeiro título interestadual da história de Cotia no futsal.
Quem vê a pequena jogadora não pensa que ela tem tanta história para contar. Priscila pode passar horas e horas contando fatos do futsal e do futebol. E, quando busca transformar as palavras em ações, mostra qualidade de passe e lançamentos, além de ser excelente na bola parada nos gramados e como goleira-linha na quadra. Num trabalho construído desde aquele Cotia x Sabesp de 2001, ela consegue mostrar qualidade para ser ofensiva nessa jogada avançada, rapidez para defender arremates de longe e, melhor de tudo, fazer com que sua equipe corra poucos riscos. Algo diferenciado e que fez escola. Tanto que, na conquista do Estadual de 2010, a Kurdana foi campeã com ela de quinta jogadora. E foi ela que, quando o placar ainda estava empatado com o Palmeiras, fez Andressa encher-se de coragem e manter a tática avançada, mesmo em uma final.
E, sobre a posição, esta maga da bola explica sua facilidade: "Como já dou treino para as goleiras, fica muito fácil de fazer a goleira-linha. A posição de goleira proporciona uma visão de jogo diferente, melhor. O segredo da ousadia é não ter medo de errar; a quinta jogadora não pode ser insegura".
A Maga passou pela chuva de títulos cotianos nos últimos três anos - com a Kurdana somando nove conquistas. Mas ela não ficou contente com o 2011 do clube. "Faltou mais união em quadra, que nem na final do Estadual de 2010. Que sirva de aprendizado para voltarmos a ser a mesma equipe guerreira", afirmou em tom crítico. Maior que o acerto é a grandeza de reconhecer os erros, corrigindo-os.
E, sobre o seu desempenho na temporada que começa, a Maga espera que 2012 seja O ano: "Estarei mais presente. Penso que nós que fazemos a situação e o ambiente, e farei assim como nos anos de 2003 e 04. Não a mesma jovem, pois os anos passaram, mas já experiente e dando meu máximo", completou.
* Xininha: não há atleta mais Guerreira
Setembro de 2009. Mais um acidente na movimentada Rodovia Raposo Tavares. E, nele, uma carreira de futsal estava sendo deixada no asfalto. Trânsito intenso, motos no corredor em alta velocidade. Um carro mudou de faixa, e não foi possível para uma certa moto brecar. As duas ocupantes voaram por cima do carro. A carona bateu no guard-rail e rastejou por vários metros, tendo fratura exposta na perna direita. Ficou um mês internada, sofreu infecção hospitalar, ficou seis meses com fixador externo, teve que fazer enxerto e, pior, perdeu dois terços da panturrilha (ou tríceps sural).
Seria o fim de carreira de uma atleta, certo? Errado! Muitos que estão lendo este texto e até mesmo este repórter não teria a mesma força de vontade para voltar a jogar. Mas aqui falo de Daniela Pereira Wauke, a Xininha, menina que ganhou esse apelido pelo seus olhos puxados, lembrando os orientais. Os índios, povo guerreiro, também possuem esses lindos olhos amendoados.
Sabem porque faço essa referência? Xininha nada mais é do que uma verdadeira Guerreira. Cada time tem a sua, mas essa da Kurdana/Cotia é especial. Nascida em São Paulo, em 29/03/1983. Alta, magra e destemida. Que não deu importância para o grave acidente e, após muita fisioterapia, natação e musculação, voltou a jogar no meio de 2010 - menos de um ano depois!
"Confesso que pensei que nunca mais jogaria. Só que eu amo o que faço, e não desisti. Vi que Deus salvou minha vida, que ele realmente existe. Foi um verdadeiro milagre", afirma ela, com a sabedoria que só tem quem passou por isso. "Aprendi que não podemos desistir nunca. A recompensa vem, independente da situação. Com fé tudo se realiza. E o mais importante - sei sim que sou um exemplo de vida para a equipe e para os demais times", completou.
Só isso já serviria para descrever a carreira de nossa personagem. Mas a vida de Xininha no esporte daria um livro, porque ela nunca se limita à nada. Começou até que tarde com a bola nos pés, com 15 anos, no campo do CA Embú, onde faturou a Copa Embú e o Campeonato Paulista da Grande São Paulo, da Federação Paulista de Futebol Feminino.
Em 1999, passou a jogar futsal também, atuando nas equipes paulistanas do Taperão e do Explosão. "Era muito legal, pois eram times bem amadores que jogavam Federação. Íamos numa kombi bem velha para os jogos", lembra ela. Entre 2000 e 02, atuou pelo salão e campo do Taboão da Serra, sendo prata nos Regionais de campo de 2001, mas transitou por outros clubes. "Eu era 'camiseira': onde me dessem uma camisa, eu jogava bola", confidenciou, com um sorriso. Tanto que estreou no Paulista de campo pelo Nacional em 2000, atuou no mesmo ano pela Seleção de Valença (RJ) num torneio internacional, foi vice do Paulista pela Matonense em 2001 (perdeu a final para o Palmeiras por 1 a 0) e jogou por São Vicente em 2002.
O hábito de ser 'camiseira' rendeu-lhe uma punição. Nem ela, nem a diretoria de Taboão e São Vicente, sabiam da regra dos Regionais e Abertos - que a atleta só pode defender uma cidade durante toda a temporada. Tomou 'gancho' de um ano e decidiu não defender mais vários clubes ao mesmo tempo.
Em boa hora tal decisão. Afinal, o 2003 marcou sua entrada na Kurdana/Cotia (então FAAC), para nunca mais sair. Faturou todos os títulos do clube desde então, com exceção do vice dos Abertos de 2005 e 2007 (já havia passado o limite de idade). Outra pessoa rica em histórias.
Mas não para por aí. Enquanto estava se recuperando, a técnica Andressa de Azevedo foi dando-lhe funções administrativas no clube. Passou a administrar o alojamento das atletas e a contabilidade. No meio de 2010, assumiu junto com Charly Wendy, fixa/volante adulta, o comando da base. Parceria que rendeu revelações e feitos, incluindo o quarto lugar da Taça São Paulo Sub 17 daquele ano e os vices nos Regionais e Piratininga 2011. Na atual temporada, ela continuará trabalhando com as pequenas, que a olham com admiração e respeito.
E, sobre a jornada que se inicia, nossa Guerreira cotiana espera "ter a oportunidade de jogar mais um ano, pois a idade esta passando. Quero muito participar da Liga Futsal, aproveitando os meus últimos anos na modalidade. Fora do campo e da quadra, quero poder ajudar no Sub 17 e 21 com a Sessa, além de continuar meu trabalho administrativo", afirmou.
Por fim, espera um grande ano para o clube que tanto ama - e é uma das diretoras. "Esse ano vai ser muito diferente de 2011. Desde aqui, na pré-temporada estamos muito focadas. Tenho certeza que conseguiremos muitos titulos, vitórias e alegias. Honestamente espero que esse ano fique marcado no clube e na minha vida para sempre", completa numa ternura que esconde a mulher batalhadora que ela é.
Contato:
(11) 8375 0391
www.acekurdana.com.br
Twitter: @kurdanacotia
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